quarta-feira, outubro 14, 2009

Carceler


Conta-nos Luiz Edmundo, em seu livro Recordações do Rio Antigo, que o italiano Luiz Bassini teria sido o introdutor do gelo e do sorvete no Rio de Janeiro. Bassini havia aberto o Café do Círculo do Comércio, na Rua Direita (atual Primeiro de Março) em sociedade com N. Denis e, em 1835, já estava envolvido na importação de gelo natural dos EUA.

O gelo vinha em lascas, nos porões dos navios, envolvidas em grossas camadas de serragem. Aqui, eram depositadas em covas abertas no chão, mantida a proteção com serragem. As perdas não eram grandes, apenas 30 a 40% no fim de três a quatro meses.

Outro italiano inaugurou o Hotel do Norte, na mesma Rua Direita, porém mais próximo à Igreja da Ordem 3ª do Carmo. A casa era modelar, para a época, e D.Pedro II, não raro, ia em companhia da Imperatriz, saborear um dos sorvetes da casa. O proprietário não demorou a exibir uma placa com os dizeres: Antonio Franzione, sorveteiro de S.S.M.M.I.I. O Hotel possuía um terraço que passou a ser freqüentado pela sociedade da época.

Os sorvetes eram de caju, carambola, manga, abacaxi, laranja, ou daquelas pitangas que existiam com fartura nas areias de Copacabana. Era feito por processo que consistia em bater uma calda dentro de um balde mergulhado em uma tina cheia de gelo e sal. Luiz Edmundo nos revela uma receita colhida no livro de José Bulhões, publicado em Lisboa no ano de 1788. O sorvete chama-se “papinha” e a receita intitula-se ”calda de papinha para gelar, em sorvete” que é assim detalhada:

“Esbrugue-se uma mão cheia de pevides de melão, outra de melancia, e com quatro, ou cinco amêndoas doces, se pisará tudo muito bem, depois de estar pisado, se lhe deita o açúcar, e passado por pano ralo se aumenta o que houver com água, até fazer três quartilhos, que se gelarão com mais brevidade que as outras caldas”. No linguajar do século XVIII, esbrugar significa descascar; pevides são sementes; pisar é moer no pilão; e o quartilho equivale a 500 ml.

Por volta de 1861, Franzione passou o estabelecimento à viúva Carceler. A partir de então, essa região da Rua Direita passou a ser conhecido como Carceler. E a Confeitaria e o Hotel do Norte destacaram-se como pontos elegantes do Rio de Janeiro dos meados do século XIX.

A foto, de Marc Ferrez, mostra a Rua Primeiro de Março onde se vê as igrejas do Carmo e o prédio do Carceler. Ao fundo, o Morro do Castelo.

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